Quando a dor inexplicada na amamentação pode ser a língua presa do bebê

Recentemente tivemos uma grande repercussão de uma mãe que postou nas redes sociais sobre a cirurgia do freio lingual de seu bebê. Então hoje vim contar uma história. Talvez seja algo parecido com a sua história também.

O bebê estava com 2 meses, e a mãe me contou em lágrimas que já havia passado em 3 consultoras de amamentação diferentes, 2 pediatras, doula, sua obstetra e não sabia o que estava acontecendo, porque mesmo corrigindo a pega, fazendo diferentes posições ela ainda sentia muita dor ao amamentar sua bebê. A dor que sentia era em agulhadas, que irradiavam para todo o seio. A dor era quase que insuportável no momento que o bebê fazia a pega, depois amenizava um pouco, mas estava presente o tempo todo. O desejo dela de amamentar era maior, mas ela estava exausta, triste e sem saber mais o que fazer. Não sabia até quando conseguiria aguentar. Para quem vislumbrava uma amamentação longa e prazerosa, isso parecia impossível.

Já tinha tentado de tudo, pomadas, laserterapia nas lesões mamilares, bico de silicone pra tentar amenizar a dor,, mas não parecia haver uma melhora completa, a fissura melhorava e cicatrizava…A culpa ainda vinha forte, pois só podia ser culpa dela o porque da amamentação estar indo assim, mesmo com tanta ajuda profissional…

Mas vamos ao ponto que quero chegar. Essa mãe estava sentindo dor. Por que? Você já  passou por algo parecido? 

Atenção! “Por fora” pode parecer que, de fato, a pega está boa. Mas torna-se irrelevante o fato da pega “parecer correta” se a mãe sente DOR! Isso é sinal de que algo na amamentação não está bem. É preciso olhar mais a fundo…

Não ignore a dor de uma mãe, nem seu instinto te dizendo que há algo errado.

O que então você  deve fazer, se está com dor ou dificuldade para amamentar? 

O primeiro passo é procurar ajuda e avaliação de um profissional especialista em amamentação. Existem diversas causas que podem levar a dor na amamentação e não raras vezes elas ocorrem concomitantes. Precisa observar a característica da fissura no peito, se houver, as características dessa dor, avaliar o bebê, a boca do bebê e a mãe e o peito da mãe. Avaliar a mamada.Detalhadamente. Não é tão simples assim, afinal.

Nesse caso acima, um freio lingual não tão óbvio não foi identificado logo no início, ou não foi dada a devida importância à ele, e essa pequena alteração anatômica trouxe outros inúmeros problemas.

O bebê tem um freio lingual curto, o que isso significa? 

O freio lingual curto é uma pequena membrana que fica abaixo da língua e limita a movimentação da mesma. Parece algo pequeno, porém a limitação da movimentação lingual altera toda a anatomia e a fisiologia da mamada, fazendo com que ocorra inúmeras dificuldades. Trata-se apenas da ponta do iceberg.

O freio lingual curto pode levar à pega incorreta, ou pode até mesmo impedir que o bebê consiga abocanhar o seio, pois o movimento de protusão e elevação da língua estão prejudicados. Isso pode causar uma dificuldade enorme do bebê mamar, e são aqueles quadros em que o bebê muitas vezes dorme no peito ou fica horas e horas mamando, sem parecer satisfeito. Também pode contribuir para um ganho de peso inadequado ou insuficiente do bebê.

Além disso, o bebê não consegue esvaziar a mama adequadamente, levando a ingurgitamento mamário e mastite, e à longo prazo, redução da produção de leite.

E a dor, porque ela ocorre? 

O bebê não consegue fazer a pega correta no seio, levando à pega incorreta. O freio lingual muda a mecânica da mamada fazendo com que essa seja por vezes extremamente dolorosa. Pode levar à fissuras mamilares que não cicatrizam, ou mesmo nenhuma lesão mamilar, mas uma dor absurda devido a pressão que o bebê faz para abocanhar o seio. Algumas mães relatam uma sensação de que está pressionando o mamilo o tempo todo ou uma sensação de lixa no mesmo, ou uma sensação de”esfregar o mamilo no asfalto”.

Como posso saber se meu bebê tem língua presa? 

A melhor forma de saber é realmente ter a avaliação de um profissional habilitado em fazer a avaliação do freio lingual, seja através de testes e também avaliando a mamada. Geralmente essa avaliação é feita por fonoaudiólogas, pediatras especialistas em Amamentação.

O teste da linguinha, já previsto em lei no Brasil desde 2014, realizado nas maternidades, é uma triagem, e pode não identificar todos os freios linguais curtos.

Algumas pistas que seu bebê pode ter freio lingual são:

  • Pega incorreta do bebê, apesar de já corrigido por uma consultora em Amamentação
  • Cliques ou estalos nas mamadas, associado muitas vezes a queixa de refluxo ou muitos gases
  • Bebês que dormem na mamada ou lutam com o peito
  • Baixo ganho de peso do bebê
  • Mãe com fissuras mamilares que não cicatrizam, ou dor na amamentação que não melhora apesar de já haver corrigido pega e posicionamento no peito.

E como resolver esse problema? 

Felizmente, existe tratamento. Consiste num procedimento simples que pode ser feito mesmo em consultório, chamado de frenotomia ou frenectomial lingual. Trata-se de um pequeno corte realizado no freio lingual, para liberação da língua e fazer com que ela tenha a movimentação adequada. Muitas vezes o alívio da dor é imediato. O procedimento, quando feito em bebês, não há necessidade de anestesia nem sedação, e permite que o bebê mame imediatamente no peito após o mesmo.

Além dos benefícios diretos relacionados à amamentação, existem ainda benefícios a longo prazo, como a possibilidade de melhorar a articulação da fala no futuro.

Veja abaixo uma foto do pré e do pós frenotomia imediato:

Voltando à história…Esse bebê tinha freio lingual curto e foi feita a frenotomia lingual. A mãe sentiu melhora pouco a pouco, e hoje amamenta seu bebê com prazer. A gente não tem idéia de quanto isso fará diferença na história dessa família não é?

Um abraço,

Dra. Kelly Marques Oliveira

Pediatra e Consultora Internacional de Amamentação (IBCLC) – CRM 145039

Consultório Espaço Médico Descomplicado – São Paulo: (11) 5579-9090/ whatsapp (11) 93014-0007

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