O problema da carne fraca: E agora, meu filho vai comer o quê?

Diante do escândalo da operação Carne Fraca, o pânico se instalou no Brasil. Sabemos que apesar das notícias serem um tanto quanto sensacionalistas, ficamos com o dilema: E agora? Dá para confiar na carne que comemos?  E ainda: Será que é seguro para meu bebê comer carne?

Confesso que fiquei bem preocupada com a situação, pensando, vamos comer o quê? Legumes e verduras têm agrotóxicos em excesso, ultraprocessados e industrializados são cheios de conservantes, aditivos e açúcares que fazem mal à saúde, e a carne agora também é podre? Não tem muito para onde fugir não é? Pensando nisso trouxe para vocês alguns esclarecimentos, vindo de uma pessoa idônea, sensata e com extenso conhecimento na área, que gentilmente respondeu algumas perguntas sobre esse assunto. O Dr. Augusto Kluczkovski Jr é Médico Veterinário, Mestre e Doutor em Ciência de Alimentos, e  Fiscal de Vigilância Sanitária do Estado do Amazonas (sim, fiscal que não foi corrompido pelos esquemas de corrupção!).

1. É seguro para meu bebê comer carne?

Dr Augusto: Sim ainda é. Existem fraudes na carne, troca de prazo de validade entre outros, mas quando isso ocorre os fraudadores geralmente encaminham esse produto ou para muito processamento, que mascara ou ao público específico, como restaurantes suspeitos que se esforçam para comprar carne barata de procedência suspeita, etc.

2. Sobre o mito de carne com papelão, é verdade?

Dr Augusto: Falso. Em Ciência de Alimentos existe uma parte que estuda justamente a textura dos alimentos, e colocar o papelão em carne moída alteraria substancialmente essa textura.
No caso em questão, houve erro de interpretação da conversa gravada na investigação. O interlocutor quando se referiu a CMS, não estava se referindo ao produto e sim a área de produção dele. É comum na indústria nomear a sala onde se faz um produto com o nome do mesmo (no caso o papelão). E os interlocutores estavam discutindo sobre entrar com embalagens secundárias de papelão, numa área onde não é permitido, justamente pelo risco de contaminar o produto com papelão.
No processo há sempre os tipos de embalagens primária (que entra em contato com o produto, geralmente plásticos não tóxicos e a secundária (na qual uma ou muitos produtos já embalados primariamente) são acondicionados. Nesse ponto a caixa de papelão é permitida. Basta ver alguns dos ultra processados (nuggets, hambúrgueres e outros envoltos em plástico e depois papelão)

3. E a carne com validade vencida? Estamos comendo “carniça”? 

Dr Augusto: Em alguns momentos pode acontecer de haver essa fraude, porém não é interessante para a indústria que isso ocorra, pois essa contaminação rotineira iria aumentar ainda mais o problema, como uma bola de neve. Tal acontecimento poderia piorar a ponto de haver uma perda para a própria indústria (dado o acontecido), além da percepção do próprio consumidor.
Além disso tanto o MAPA quanto as VISAs (órgãos que fiscalizam) se esforçam em programas de monitoramento e controle dessa fraude. Eu mesmo já fui ameaçado de morte por apreender produto nessa situação, continuo vivo e o produto incinerado. Acontece, mas é pontual.

4. O ácido ascórbico usado para mascarar a carne vencida é de fato cancerígeno? 

Dr Augusto: Não. O Ácido Ascórbico que “atende” também pelos nomes INS 300 (para rótulos) e vitamina C para a grande população que o conhece é um acidulante e antioxidante bastante seguro utilizado na indústria de alimentos, diria que o mais utilizado no mundo. Se seu uso for abusivo em quantidade e rotina toda a literatura médica indica problemas de cálculos renais e não câncer. O ácido sórbico (nome comum sorbato de potássio) que pode haver confusão também é seguro. No entanto, estes produtos só podem ser utilizados em linguiças, salsichas, nuggets, salames e outros processados e nunca em carne in natura.

5. Como escolher a carne no mercado? Há alguma que podemos confiar?

Dr Augusto: As regras básicas de cor, cheiro, textura que o consumidor conhece, aliado ao conhecimento da procedência dos produtos e avaliar as condições de conservação (temperatura e higiene do local) são suficientes. Não é necessário pânico. Se encontrar um problema entre em contato com o vendedor ou fabricante, e solicite a troca, em posse da nota fiscal. Mas a cultura popular conhece carne estragada e dificilmente se consegue mascarar produto in natura decomposto. A atenção é importante, pois casos pontuais podem acontecer.

6. Os embutidos também tem riscos? 

Dr Augusto: Os embutidos tem um risco maior sempre associado pela maior manipulação e maior facilidade de mascarar devido a necessidade de aditivos, mesmo salames coloniais recebem nitrito, nitrato e ácido ascórbico, faz parte da receita.
Justamente por esse motivo, aliado ao desbalanço nutricional pela mistura de outros ingredientes (inúmeros conservantes e aditivos), todas as recomendações que conheço é de não dar embutidos e processados aos nossos bebês. Desde grupos de mães até a OMS esta é sempre a recomendação.
Mas para o consumo nosso (adultos) devemos entender que um lema utilizado na ciência de alimentos é bem verdade. “Sem matéria prima de qualidade, por mais esforço que se tenha, não existirá produto final de qualidade.”

Agora, mais um adendo meu ao post!

7. Preciso dar carne ao meu bebê? 

Veja o que diz o trecho do Manual de Nutrologia da SBP:
“Com o crescimento acelerado do primeiro ano de vida, os requerimentos de ferro e zinco aumentam muito além do que o leite materno costuma oferecer. Cerca de 50 a 70% do zinco, assim como 70 a 80% do ferro, deverá vir de fontes complementares por meio da alimentação. Estes nutrientes estão presentes, em grande parte, nas carnes e vísceras.”
A carne é uma grande fonte protéica para o bebê, e de outros micronutrientes como visto acima. A orientação é que se não houver ingesta de carne pela criança, deverá ser complementada com outras proteínas, se possível de origem animal por sua maior biodisponibilidade, sob orientação do médico pediatra e nutricionista, com suplementação de macro e micronutrientes quando indicado. Uma alimentação variada e saudável, com acompanhamento adequado é o mais importante!
Acrescento ainda: 
Você deve estar pensando, será que ainda é possível buscar uma alimentação saudável? Eu acredito que sim! Priorize o pequeno agricultor, os legumes, verduras, hortaliças e frutas da estação, quando for possível compre orgânicos. Exija fiscalização e certificação dos alimentos pelos Ministério da Agricultura. Observe o aspecto da carne/peixe/frango no momento da compra. Felizmente estamos num momento em que a opinião popular é ouvida, e temos força. Podemos usar isso ao nosso favor e cobrar das autoridades medidas necessárias. Ainda temos muito que caminhar, mas podemos seguir fazendo nossa parte!

Leia mais sobre alimentação saudável em

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Dra Kelly Marques Oliveira

Pediatra, Alergista e Consultora Internacional de Amamentação (IBCLC)

CRM 145039

Consultório Espaço Médico Descomplicado: (11) 5088-6699/ whatsapp (11) 93014-0007

Entrevista concedida pelo Dr. Augusto Kluczkovski Jr – Médico Veterinário, Mestre e Doutor em Ciência de alimentos, Fiscal de Vigilância Sanitária do Estado do Amazonas

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